Lisboa existe
Lídia Jorge *
Uma recolha de textos publicada há anos em França, tem por título LISBONNE N’EXISTE PAS. Muitos dos textos que lá se encontram são dos melhores que alguma vez foram escritos sobre esta cidade. Possivelmente, o título surgiu desse desafio, ou esse desafio surgiu desse título, a ordem não importa. O que interessa é que ele coloca a questão no sítio certo – Quando se quer escrever sobre uma cidade, ela parece não existir fora de nós, a totalidade perde-se, a realidade some-se. Ficamos com a sensação da traça perdida no armário, entre costuras e enchumaços – Toda a Cidade é uma criatura demasiado grande, demasiado complexa, infinitamente múltipla e vária, redonda e informe, estelar e oval, caótica e de esquadro, isto é, Lisboa não existe – Lisbonne n’existe pas.
Pensei nessa epígafre maravilhosa que poderia ser a divisa de todas as cidades, quando li estes textos sobre Lisboa. De novo, os jovens aí estão. Trazem o rumor das outras cidades, o amor que as atravessa, a confusão entre os braços que apertam o amor e a cidade onde os beijos se dão. E a beleza de viver entre elas, as cidades. E a beleza de viver entre eles, os habitantes das cidades. E a repulsa contra a fealdade, contra o opróbrio que se esconde nas cidades, o lamento pela desinteligência que existe no meio das ruas, contra o voo dos pombos demasiado gordos que rastejam pelo chão. O repúdio contra a cidade que não voa. Afinal os jovens escrevem porque de novo existem, e de novo sabem, por instinto, o que falta à vida para ser completa. De novo aí está a nova geração para dizer que Lisboa não existe. Quando escreve, existe. E isso é que é maravilhoso e a faz existir.
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* Texto lido na entrega dos prémios do concurso literário "Lisboa à Letra",
destinado a jovens
destinado a jovens
organizado pela Câmara Municipal de Lisboa
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